25 de dezembro de 2014

ELES E ELAS – contos/Maria Christina Lins do Rego Veras. José Olympio. RJ. 2014.

Não é fácil trilhar carreira de pais famosos. Sempre fica no leitor o referencial. Assim acabou ocorrendo comigo em relação à autora, filha de José Lins do Rego, membro da Academia Brasileira de Letras e autor de obras como Menino de engenho, O moleque Ricardo, Usina, Fogo morto, Riacho doce, dentre outras. Conviveu com grandes nomes da literatura brasileira como Gilberto Freire, Luis jardim, Olívio Montenegro (seu padrinho de batismo) e Graciliano Ramos que chegou a morar com a família Lins do Rego após deixar a prisão em 1930. Casada com o diplomata Carlos dos Santos Veras, o que propiciou moradia em vários países e falar vários idiomas. Sua produção cultura começou com a pintura, e, a partir de 2003, decidiu escrever as lembranças da infância alagoana e mais recentemente, sua experiência ao redor do mundo e outras histórias. Um livro composto por 110 páginas, 20 contos curtos, em linguagem ágil, retratando o cotidiano. A obra esta dividida em duas partes, Eles e Elas. Na primeira abrigando 7 textos com títulos com nomes próprios masculinos, e na segunda, 13 com nomes femininos. 

25 de agosto de 2014

A MORTE/Maurice Maeterlinck.- São Paulo. Bira Editores. 2013.

A Morte - Maurice Maeterlinck (1862 - 1949), escritor belga, único em sua nacionalidade a receber um Nobel de Literatura (1911), vem a um século atrás (1913) promover um debate sobre esse tema provocante em cientistas, filósofos, teólogos sem uma conclusão definitiva. Maeterlinck não acreditava em Deus, o que de certa forma deixa-o isento de qualquer influência religiosa, embora seja oriundo de uma família católica conservadora. Poeta, teatrólogo, ficcionista, ensaísta, chama a atenção por suas posições que os humanos deveriam preocupar-se com a vida, esta sim, e que tem sentido e não a morte - única certeza na vida e além de tudo - uma desconhecida. Faz uma observação de que quanto mais avançada a ciência, mais sofrimento ao ser humano pelo prolongar da vida sem qualidade. Diz da consciência médica no sentido de dar ao humano a eutanásia evitando sofrimentos horríveis a espera de um achado da ciência. Considera a reencarnação como a mais plausível e racional das teorias religiosas ao tempo em que reconhece não haver uma prova tácita. Limita-se essa teoria, segundo o autor, em afirmações que flutuam no espaço, chegando a ser duro ao asseverar que "apoia apenas por argumentos sentimentais". Mas admite, "E, seja qual for a força que nos sobreviva e presida à  nossa existência no outro mundo, essa existência, ainda que a suponhamos pior, não poderia ser menos vasta nem menos feliz que a existência de hoje. Não terá outro curso, senão o infinito; e o infinito não é nada, se não é a felicidade".  

7 de agosto de 2014

CRÔNICAS PARANAENSES - Concurso Nacional de literatura/Os vencedores.- Curitiba. Secretária do Estado da Cultura. 1999.

A presente obra é composta pelos vencedores do Concurso Nacional de Literatura promovido pela Secretária do Estado da Cultura do Estado do Paraná, no ano de 1999. O objetivo, segundo a secretária de cultura à época, era fazer o registro de pessoas, paisagens e momentos que contam o Paraná reproduzindo desde ideias comuns a ideais singulares, com ternura, o humor e o talento que se revelam nos bons autores. São 28 crônicas por 20 autores. Sempre estamos buscando em nossas leituras os clássicos, não que isso seja um erro, mas temos novos escritores extraordinários no Brasil, esse livro é uma prova disso. Apesar de parecer a premiação ter sido dividida por temas, valeu a pena. O termo crônica deriva do grego Chronos que é traduzido para o português como tempo, tratando-se de uma narrativa informal que procura captar um flagrante da vida cotidiana. Considerada como um gênero menor por oscilar entre a literatura e o jornalismo. Nelson Rodrigues, Ruben Alves, Rubem Braga, Rachel de Queirós, Ignácio de Loyola Brandão, dentre outros, se consagraram nesse gênero literário no Brasil.

6 de agosto de 2014

COACHING PRÁTICO – fundamentos, características e Métodos /Scotton, A., Salício, C. e Gonzales, F. - Clube dos Autores – São Paulo, 2014.

Coaching uma palavra utilizada na Inglaterra, nos tempos medievais, para designar o condutor da carruagem, cocheiro. Na década de l970, Timothy Gallwey, um treinador de tênis da Universidade de Harvard, nos EUA, publicou um livro “The inner game of tênis” – O jogo interior do tênis – com uma teoria em que, para superar o adversário de fora, primeiro há que se superar o adversário interior, nascendo aí o conceito moderno de Coaching, que posteriormente nos anos 80 do século passado abriria uma vertente para o coaching empresarial.  É um processo (treinamento) que se utiliza de recursos e técnicas de várias ciências a conduzir a pessoa ou grupo a atingir necessidades como metas, solucionar problemas e desenvolver habilidades. Os autores são de formações diversas dento da área de psicologia, pedagogia e teologia. Para eles “sonhos não envelhecem”... “resgatar um pouco desta esperança, deste sonho e desta magia é tarefa também do coach, jamais vendo o seu cliente (coachee) como um mero recurso humano". Então, coaching é o processo, coach o treinador e cochee aquele que recebe o treinamento. É um dos livros mais completos sobre o assunto publicado até o presente. Para adquiri-lo acessar WWW.clubedeautores.com.br  

5 de junho de 2014

NÃO DEIXE PARA DEPOIS O QUE VOCÊ PODE FAZER AGORA - dicas práticas para organizar seu tempo e se tornar mais produtivo / Rita Emmett. – Rio de Janeiro: Sexante, 2008.




Confesso! Não sou próximo a livros de auto-ajuda ou mesmo auto-estima como se intitula este. Não que eu ache uma perda de tempo em lê-los, mas trata-se de trabalhos comerciais utilizando-se de vários matizes da psicologia, pedagogia, psicanálise, dentre outros, para alcançar um mercado editorial envergonhado de frequentar as Igrejas Neo Pentecostais que abordam de maneira ‘magistral’ o mesmo tema. Sempre estamos sendo presenteados com esse tipo de livro, eis aqui um caso a mais. Aqui um fato chamou-me a atenção. É que o poema conhecido pelo nome de ‘Instantes’, atribuído a Jorge Luis Borges, presente na contracapa de cardápios de uma infinidade de bares e restaurantes brasileiros,


‘Se eu pudesse viver novamente a minha vida,
na próxima trataria de cometer mais erros.
Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais.
Seria mais tolo ainda do que tenho sido;
na verdade, bem poucas pessoas levariam a sério.
Seria menos higiênico. Correria mais riscos,
viajaria mais, contemplaria mais entardeceres,
subiria mais montanhas, nadaria mais rios.
Iria a mais lugares onde nunca fui,
tomaria mais sorvete e menos lentilha,
teria mais problemas reais e menos imaginários.
Eu fui uma dessas pessoas que viveu
sensata e produtivamente cada minuto da sua vida.
Claro que tive momentos de alegria.
Mas, se pudesse voltar a viver,
trataria de ter somente bons momentos.
Porque, se não sabem, disso é feito a vida:
só de momentos - não percas o agora.
Eu era um desses que nunca ia a parte alguma
sem um termômetro, uma bolsa de água quente,
um guarda-chuva e um pára-quedas;
se voltasse a viver, viajaria mais leve.
Se eu pudesse voltar a viver,
começaria a andar descalço no começo da primavera
e continuaria assim até o fim do outono.
Daria mais voltas na minha rua,
contemplaria mais amanheceres
e brincaria com mais crianças,
se tivesse outra vez uma vida pela frente.
Mas, já viram, tenho 85 anos
e sei que estou morrendo’



como autoria de Nadine Stair, poetiza americana de Louisville, Kentucky. Sobre a autoria de Borges referencia-se Maria Kodama, viúva do poeta e editora das suas obras, diz, no prefácio do volume “Borges en la Revista Multicolor”, um livro improvisado que inclui textos de Borges e outros a ele atribuidos: “O mais incrível é que as mesmas pessoas que não aprovam a publicação de três obras inéditas de Jorge Luiz Borges {“El Tamaño de mi Esperanza”, “El Idioma de los Argentinos” e “Inquisiciones”], nada fizeram, diante do poema “Instantes”, da escritora norte-americana Nadine Stair, atribuído falsamente – creio que por ignorância – a ele. Essas pessoas – repito! - nada disseram sobre o estilo ou o conteúdo desses versos, apesar da linguagem infantil que neles é empregada e apesar do conteúdo que desdiz totalmente todos os princípios que Borges sustentou até o fim da sua vida. “Chegou-se ao horror de ler e estudar, em instituições oficiais, esse poema sem nenhum valor literário, atribuindo-o a Borges.” Outro detalhe é que ‘em 1976, Borges tinha 77 anos. Por que razão diria “faz tanto tempo”, referindo-se a um poema “escrito” aos 85? Ou, admitindo-se que exerceu aí o papel de um poeta fingidor – como somos - todos os poetas – e escreveu um poema na primeira pessoa, mas “sobre” alguém que teria os 85 anos que ele não tinha’. Na pesquisa encontrei outros supostos autores desses versos, porém, me ative ao Borges e a Nadine. E assim, muitos são os livros, textos e poesias com autorias negadas. 

27 de maio de 2014

CRIMES QUE ABALARAM O BRASIL / organização George Moura e Flávio Araújo, reportagens de Marcelo Faria de Barros e Wilson Aquino: - Editora Globo, 2007.


Sobre o trabalho levado a efeito pela rede Globo de Televisão, no programa Linha Direta, apresentado pelo jornalista Domingos Meireles, foram selecionados sete crimes de grande repercussão na imprensa e, consequentemente, na sociedade brasileira. O crime da mala, O caso dos irmãos Naves, O crime de Sacopã, A fera da Penha, Dana de Teffé, Caso do Chico Picadinho e O mistério do desaparecimento de Carlinhos, onde procurou retratar traços do comportamento humano, ao tempo em que, de forma romanceada revela ineficiências e influências nas esferas policiais e judiciárias no Brasil; a fragilidade e incompetência do ‘modus operandi’ dessas instituições, levando a uma reflexão sobre a necessidade de mudanças nos ritos investigatórios, processuais e de execuções penais. 

24 de maio de 2014

CALEIDOSCÓPIO / Sebastião Lázaro Henriques: - Editora Kelps, 1995.

CADEIDOSCÓPIO / Sebastião Lázaro Henriques: - Editora Kelps, 1995.

Poetar é colocar para fora as angustias, desditas, amores, menos prazeres e mais dores. Poetar é falar dor alheia como se fosse sua. Poetar é brincar com as letras na construção de palavras, destas na construção de frases adornadas de rimas e aliterações. Poetizar é tratar com sensibilidade, leveza, carícia e delicadeza as coisas do mundo.  Na coletânea de poemas que compõe a obra o autor poetou ao tempo em que poetizou. No momento em que esse gênero literário vai se distanciando abrindo espaços outras categorias, nos enche de prazer encontrar alguém que procura fazer das rimas e versos o seu escrevinhar. O livro me chegou por acaso através de uma participante do Congresso das APAES realizado neste ano de 2014. Livro lido num só fôlego como diziam os antigos. Uma pequena mostra do poeta.

FOME

Eu não sei dizer exatamente
A nascente do meu estranho nome
Talvez prá me fazer diferente
Ou talvez, prevendo a minha fome!

Sou Zé Faminto da Silva e Oliveira
Nascido e criado ao norte de “Fartura”
E o engraçado é que a desgraça certeira
Era á única abundante nessa terra dura.

Casei, vieram filhos, filhos e filhos mais
Rosa, Violeta, Rosinha e Margarida
Tantas flores a viver seus finais
Na falta de pão, de esperança e de vida!

E se foi a primeira, a segunda, a terceira
A cantar com a morte a toada da partida
Fiquei só, a esperar a foice ligeira
Do fim, e a agonia de se fazer mais sentida.

Eis que então tomei de meu meio, único, final.
E matei a fada da miséria em meu magro peito
A você que lê meu escrito, não me julgue mal
Eu me fui, somente por não haver mais jeito.

Peçam perdão, por mim, junto aos meus
Fui forte, excedi a força dos Homens
Mas cansei, fui me encontrar com Deus

Assino e me desculpo, Zé Faminto – Agora sem fome!!!

22 de maio de 2014

CURIOSIDADES DE PIRENÓPOLIS / Arivaldo Pereira da Silva: Pirenópolis. Editora Serra Dourada.

O autor faz um registro do que ele denomina de ‘fatos e história reais’ ocorridos na cidade e no município entre os anos de 1880 a 1980 escolhidos criteriosamente, onde ao final de cada um deixa um comentário ressaltando o bom senso e a sabedoria. Deixa de citar os nomes dos protagonistas alegando questão de ética e evitar ferir sensibilidades, o que deixou a obra meio que sem tempero. São relatos interessantes, identificados com o período e o interior do país, dos quais destacaria: Defunto também fala Remédio para dor de dente, Boiadeiro de galinha, O tempo parou, Arte culinária, Aposentadoria animal, Botija de ouro, Suicídio por amor, Incógnita, Falsificaram o m eu produto. Encerra o livro com alguns Provérbios, Definições e Pensamentos. Um livro singelo, mas que vale pela observação na folha de rosto: parte da renda comercial deste livro será destinada à Creche Benedita Ester da Silva e Asilo São Vicente de Paula de Pirenópolis.

Luiz Humberto Carrião.

21 de maio de 2014

VOCÊ É JOVEM, VELHO OU DINOSSAURO? – descubra com este livro / Ignácio Loyola Brandão; ilustrações Camila Mesquita. – São Paulo : Global, 2009.

O livro de Loyola Brandão descreve o sabor e cheiro da infância da geração SEX. Mas não esse SEX que imediatamente lhe veio à cabeça - SEX de sexagenária. Na capa uma observação do autor: ‘Testes para saber se sua memória é uma coisa, mas suas lembranças podem ser outras, mostrado que você é mais jovem, mas também pode ser mais velho do que se imagina’. Esses testes são dispostos de maneira tal à geração SEX, que orienta o caminho da lembrança através das ruas, bairros, cidades, estrutura familiar, o rádio, o surgimento da televisão com seus comerciais, novelas e programas de auditórios; artistas, jornalistas, cantores, cantoras, bares, boates, lambretas, carros de luxo como o Simca Chambord; serenatas, brincadeiras dançantes nas tardes de domingo; moda, comidas e aperitivos, cigarros, enfim, um traço do que viveu essa geração. A última frase do livro: ‘Acha que este livro poderia se chamar Those where the Days?’. Imediatamente recorri à dedicatória que respondia: ‘Carrião, na verdade somos todos vividos. Abraço amigo (rubrica Ignácio Loyola Brandão) 30/4/14.    

Luiz Humberto Carrião

14 de maio de 2014

UTOPIA - o discurso e a prática \ Elder Rocha Lima - Brasília : Verano Editora, 2008.

Dentre os homenageados na 6ª FLIPIRI - Festa Literária de Pirenópolis - Elder Rocha Lima - arquiteto, pintor, desenhista, crítico de arte, artista gráfico, escritor e professor. Assim que levei o livro para o autógrafo disse: ”esse foi o meu primeiro livro, não gosto dele”, com um olhar querendo dizer: escolha outro. Foi então que respondi que o escolhi, exatamente, por ser o primeiro, toda a pureza de sua alma deverá estar condita nele. E está. Um livro onde a utopia é admitida, como o próprio autor relata, “uma proposta de vida alternativa, na qual rompemos com regras e princípios vigorantes e, mais ainda, se as utopias não são novas regras que forçosamente devam ser adotadas, são, pelo menos, experiências ou simulacro delas, merecedoras de estudo e meditação”. O autor ‘navega’ pela Esparta de Licurgo, República de Platão, Utopia de Thomas Morus, A Cidade do Sol de Campanella; pelos rotulados de socialistas utópicos, Saint-Simon, Charles Fourier e Robert Owen; Etienne Cabet, autor de “Viagem a Icária” onde expressa claramente a influência de Morus; Ebenezer Howard, Le Corbusier, Frank Lloyd Wright que o autor os enquadra no que chamou de “Utopias Urbanísticas”. “Terra de Eldorado” que inspirou intelectuais europeus, como Francois Marie-Arouet, conhecido por Voltaire, a quem o autor faz uma fantástica interpretação de “Cândido e o Otimismo”. Analisa Palmares como a utopia dos escravos e Canudos como uma utopia sertaneja. Elder Rocha Lima referencia dois momentos históricos pouco explorados pela nossa historiografia: A Côlonia Cecília, criada no interior do Paraná pelo anarquista italiano Giovanni Rossi - agrônomo, musicista e escritor - autor de um opúsculo, “II Commune in Riva al Mare”, durante o Segundo Reinado, inclusive, com o incentivo, beneplácito e ajuda  de Pedro II, rendido aos encantos da obra de Rossi. A outra, a República dos Guaranis, 25 páginas de extensa pesquisa sobre o que considera ser “um dos capítulos mais gloriosos, instigantes e generosos da história do Brasil”. Sobre as Reduções o autor deixa na p. 88, uma visão lúcida, histórica, sociológica e antropológica de Darcy Ribeiro: “Essas utopias se opunham tão cruelmente ao projeto colonial que a guerra se instalou prontamente entre colonos e sacerdotes. De um lado, o colono, querendo por os braços índios a produzir o que os enricasse, ajudados por mundanos curas regulares dispostos a sacramentar a cidade terrena, dando a Deus o que é de Deus e ao rei o que ele reclamava. Foi um desastre, mesmo onde as missões se implantaram produtivas e até rentáveis para a própria Coroa - como ocorreu com as de Sete Povos, no Sul, e ao norte na missão tardia da Amazônia - prevaleceu a vontade do colono, que via nos índios a força de trabalho de que necessitava para prosperar”. Um livro didático no discurso e triste na historiografia prática pelo alto custo pago por aqueles que acreditaram numa possibilidade alternativa para a vida.


Luiz Humberto Carrião

1 de abril de 2014

O PRATO ENCANTADO / Valéria Belém com ilustrações de Adriana Mendonça. Coleção Eu gosto m@is leitura. Ibep Jr. São Paulo. 2014.

Valéria Belém foi a responsabilidade em aluna no Ensino Médio. Profissionalmente, aquela que leva seus professores a realização. No lançamento de ‘O prato encantado’ lá estava eu, dona Margarida – sua mamãe – e os colegas de colégio com suas esposas e filhos. Chamou-me num canto, tirou da bolsa um pratinho dizendo: _ professor ele existe! Era naquele momento, quiçá, o maior troféu exibido a alguém. Pude ver então que o livro ia muito além de sua indicação - faixa etária de 9 a 10 anos de idade –. Era também um livro para gente grande. Chegado o momento de sua leitura, ‘O prato encantado’ esclareceu - à criança - a compreensão sobre si mesma, ao tempo em que, clareou a trajetória - no tempo e espaço - rumo a adultez. Existem contos de fadas não só como forma literária compreensível às crianças, mas, também,  como obra de arte de profundo significado para os adultos.

Luiz Humberto Carrião

21 de março de 2014

DEUS NO DIVÃ, confissões do demônio sobre as peripécias de dois fiéis antagonistas / Taty Ades. – Osasco, SP : Novo Século Editora, 2010.

Meu primeiro contato com a psicanalista Taty Ades se deu por conta do livro em parceria com o psiquiatra Eduardo Ferreira Santos, ‘Borderlaine: criança interrompida – adulto borderline', onde desnudam o transtorno de personalidade limítrofe, sintomas, familiares e descrição de quadros clínicos, resenha no (www.personalidadeborder.blogspot.com.br). Agora dou de frente com a escritora, dramaturga, teatróloga, e produtora cultural nesta obra extraordinária, Deus no divã: ‘Caros leitores, quem lhes escreve esse desabafo, sou eu, o Diabo, ou se preferirem Lúcifer, Asmodeu, Azazel, Satã, Belzebu, Quaset, entre outros. [...] Aqui coloco a mim e a ti, bom Deus, no divã e peço aos leitores que entendam que a minha súplica provém unicamente de uma necessidade crucial de todos nós’. Quão importante é essa necessidade crucial que levou o Diabo e Deus ao divã? Que cena fantástica imaginar o Diabo tentando convencer Deus para não desacorçoar dos humanos, disputando o amor de uma humana, discutindo com grandes personalidades o amor, como o fizera Platão em O Banquete, ou Júlio Dantas em Ceia dos Cardeais. Imaginar a preocupação do Diabo com a depressão e o ceticismo de Deus em meio a personagens reais e fictos é uma maneira de enxerga-los mais humanos, inclusive. A autora questionada sobre o tema em uma entrevista resumiu: ‘sempre questionamos a existência ou não de Deus, será que ele não questiona a nossa? Será que esse ser não se sente cético ao ver a humanidade tão cheia de miséria, corrupção, violência, ódio? O que diria esse Deus? Estaria ele cansado e abatido com tudo isso? Dessa forma me veio à ideia de coloca-lo no divã’. Uma obra extraordinária da literatura brasileira, mais ainda, em se tratando de uma jovem escritora. Valeu a pena tê-lo lido.

Luiz Humberto Carrião   

22 de fevereiro de 2014

CINEMA, LITERATURA, PSICANÁLISE / Antonio Carlos Pacheco e Silva Filho. – São Paulo: EPU, 1988.

Doutor em medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) na área de Psiquiatria, Membro graduado do Institute of Living, Hartford, Connecticut, EUA, professor de Psicopatologia e Psicoterapia Psicanalíticas no Instituto Sedes Sapientiae, membro efetivo da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, autor dos livros: Sob a luz da psiquiatria, Evolução da Psicanálise e Perversões Sexuais – um estudo psicanalítico, Antonio Carlos Pacheco e Silva Filho nesta obra, Cinema, Literatura, Psicanálise, aborda a temática da sensibilidade intuitiva presente em grandes escritores e diretores de cinema, fazendo com que os mesmos, sem que percebam, entrem em contato com fantasias inconscientes universais, que acabam como conteúdo latente em suas obras. O autor utiliza-se da imagem do sonho para exemplificar sua posição: algo assim como o que ocorre em um sonho, quando o conteúdo manifesto é lembrado pelo sonhador e o conteúdo latente representa a expressão de sua fantasia inconsciente. A literatura e o cinema precedem a Psicanálise em sua teorização cientifica por Freud, que desde um primeiro instante, admitiu que grandes escritores mostraram saber da existência do inconsciente bem antes de sua descoberta e colocação num enfoque científico. Esse conhecimento, o autor estende a cineastas intuitivos do inconsciente como Buñel, Pasolini, Bergman, Bolognini, Polanski, Spielberg, dentre outros. Vários filmes e obras literárias são analisados à luz da Psicanálise em linguagem acessível o que torna o livro inteligível universalmente, e, em concomitância, agradável e revelador.


Luiz Humberto Carrião

20 de fevereiro de 2014

LITERATURA E PSICANÁLISE / Ruth Silviano Brandão. – Porto Alegre: Ed. Universidade / UFRGS. 1996.

A autora é Mestre e doutora em Estudos Literários pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), pós-doutora pela Universidade de Paris VIII, escritora, tradutora.

Literatura e Psicanálise é uma organização de textos resultantes de antigas inquietações teóricas, alguns já publicados em revistas de literatura e/ou de psicanálise e outros inéditos, extraídos de sua tese de doutorado.

Freud utilizou-se das artes em geral, notadamente da literatura para ilustrar suas questões e descobertas, o exemplo clássico vem da tragédia de Sófocles, Édipo Rei. Recentemente, um pouco mais diverso Lacan afirma que o inconsciente se estrutura como uma linguagem concedendo um valor revolucionário à autonomia do significante, também recorrendo ao literário. Com isso, a autora já de início afirma que a psicanálise, por sua vez, tem servido de suporte teórico a diversas questões da literatura: ‘Todo texto é uma lacuna, esburacado. Ele recobre suas lacunas com um tecido, para dissimulá-las. O tecido que mascara ao mesmo tempo revela, adaptando-se perfeitamente ao contorno daquilo que vela (...)’, Sarah Kofman, em L’Enfance de l’art: UBE intérpretation de l’esthétique freudienne. Paris: Payot, 1975.

Para a autora a arte literária é talvez o lugar onde o inconsciente se encena de forma privilegiada, pois ela se faz e se constitui no seio mesmo da linguagem. Essa é sua matéria-prima, possibilidade de corporificação, na superfície do texto, das imagens do impossível, que aí se alucinam. É no percurso dos discursos, no fio enunciativo da trama ficcional, que o desejo aflora com a construção de seus objetos sempre se substituindo, sempre se travestindo de novas e inéditas aparências, com as palavras-vestes que os fazem cintilar.

A obra literária, a estética, a história, a estória, expressam a vontade ou desejo que quem a produz, às vezes até se projetando em personagens (o texto é o tecido que mascara ao mesmo tempo revela...). Neste contexto, a análise psicanalítica tem como objetivo desnudar o que provocou essa vontade, esse desejo e porque não, essa estética. Com isso, leva o leitor a enxergar o texto com uma amplitude mais hominal.


Luiz Humberto Carrião

9 de fevereiro de 2014

O ESPÍRITO DA PROSA: uma autobiografia literária / Cristovão Tezza. – Rio de Janeiro: Record. 2012.

Cristovão Tezza nasceu em Lages, Santa Catarina, transferindo-se ainda criança para Curitiba, onde vive até hoje. Ficcionista consagrado, com incursões na área teórica e na crítica literária, publicou entre outros, os romances: Trapo, O fantasma da infância, Juliano Povollini, Aventuras provisórias (Prêmio Petrobrás de literatura, 1987), Breve espaço entre cor e sombra (Prêmio Machado de Assis da Biblioteca Nacional de melhor romance de 1998), A suavidade do vento, Uma noite em Curitiba, Ensaio da paixão e O fotógrafo (Prêmio da Academia Brasileira de Letras), Bravo, Um erro Emocional, Beatriz (contos) e, O filho eterno. Tezza foi publicado em vários países, na França recebendo o prêmio Charles Brisset, de melhor livro do ano, da Associação Francesa de Psiquiatria.

O livro desnuda a prosa desde a invenção da escrita para escrever cartas que encurtavam distância de pessoas, inclusive, no quesito saudade, até o advento da internet que na visão do autor, popularizou a palavra escrita de uma forma jamais vista em nenhum momento da história; não há uma só página da internet sem alguma palavra escrita e sem alguma exigência ou algum convite para que se escreva algo, e sempre algo familiar, intransferível, próximo; apesar do inacreditável poder imagético da internet, a palavra reina soberana.

Nas respostas define e se define. Isto torna o livro interessante: O que leva alguém a escrever? O que nos leva a escrever? Sem problemas para resolver, para que serve a literatura? Sem problemas pessoais para enfrentar, para que serve a literatura? ...sem saber eu já organizava cada passo da minha vida em torno da ideia de ser um escritor. E o que eu havia escrito? E o que eu escrevi agora, depois da ruptura do emprego formal no escritório? Que conceito eu tinha, agora, de literatura? E naquele momento (1970), o que eu queria escrever? Quem sou eu, afinal, para falar em primeira pessoa? Todo escritor, a todo instante, se vê às voltas com amontoados de palavras que parecem se descolar, aqui e ali, de suas referências, como animais indóceis, e é preciso domesticá-los. Que aprendizado é esse? Alguém havia me dito, depois de ler um poema meu: Você quer escrever como se já fosse o Manuel Bandeira. Tem de começar do começo. [...] Rio Apa [...] Disse-me: Sim, você tem de escrever como se você fosse o Manuel Bandeira, o Faulkner, o Conrad. Pense sempre no máximo, queira sempre o máximo, ou não vale a pena escrever. Imediatamente absorvi a pretensão, empinando o nariz, como quem súbito conquista outro patamar: sim, por que não? De que serve um livro sem gravuras?, perguntava Alice. Por quais caminhos cheguei aí, pesando o que penso nesse espírito da prosa que agora escrevo? Afinal, o que tinha mesmo a dizer? [...] Pessoas felizes não escrevem... Por que diabos iriam eles largarem os prazeres tranquilos da felicidade pela incerteza e terrível solidão de escrita que, quando de farto assumida, é uma viagem sem volta? De que modo este narrador – a linguagem que conta o livro que escrevo – não se confunde com aquele que escreve? Conclusão?

Em sua biografia literária o autor traça todo um panorama de sua geração localizando os ideários dos anos 1960 e 1970 acabando num desabafo: Talvez a ausência mais terrível da minha geração (nascido em 1952) tenha sido decorrente da morte da política como atividade pública cotidiana, e o apagamento da ideia da diferença política como essencial à vida em comum, um conceito jamais assimilado plenamente pela cultura brasileira; tudo, dos hippies orientalistas aos gorilas militares – parecia convergir para o conceito de um mundo único que suprime todos os demais. Parece que a única ideia de transgressão que restou, vicejou e que deitou raízes profundas foi a transgressão moral – todos os dias vejo na televisão cidadãos da minha idade, que certamente viveram a mesma atmosfera do meu tempo e partilharam quem sabe os mesmos sonhos transformadores, hoje entranhados na máquina de Brasília e afundados até o pescoço na clássica corrupção nacional.

Luiz Humberto Carrião (l.carriao@bol.com.br)

24 de janeiro de 2014

BEM-VINDO: Histórias com as cidades de nomes mais bonitos e misteriosos do Brasil / organização: Fabrício Carpinejar.- Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012.

Fabrício Carpinejar é poeta, escritor e jornalista. Ganhou os prêmios Jabuti 2009, APCA 2011 e Olavo Bilac 2003, entre outros. É apresentador da TV Gazeta, cronista do Jornal Zero Hora e comentarista da Rádio Gaúcha.

O livro utilizando-se de escritores consagrados, Fabrício Carpinejar, percorre o país através de histórias relacionadas com cidades com nomes interessantes e misteriosas como ele mesmo as intitula. Foi-me sugerido por uma funcionária da FNAC que colocava preços em livros para a promoção com elogios rasgados ao organizador.

Correndo os olhos sobre a obra logo um questionamento: como ter a ideia de organizar textos sobre essas localidades? No prefácio assinado por Roberto Pompeu de Toledo a explicação. Esclarece o prefaciador que em 2007, em sua coluna da revista Veja, escreveu sobre nomes das cidades brasileiras de nomes interessantes que chamou a atenção de  Carpinejar conduzindo-o à ideia do livro.

Bem – vindo: histórias com as cidades de nomes mais bonitos e misteriosos do Brasil têm sem sua organização dez textos extraordinários, sobre dez localidades brasileiras, assinados por Altair Martins, Cíntia Moscovich, João Anzanello Carrascoza, Luiz Ruffato, Luiz Vilela, Lígia Fagundes Teles, Marçal Aquino, Maria Ester Maciel, Ronaldo Correia Brito e Sérgio Faraco.


Luiz Humberto Carrião (l.carriao@bol.com.br)

23 de janeiro de 2014

VAMPIRO DE CURITIBA / Dalton Trevisan.- 32ª ed. Ver. – Rio de Janeiro: Record, 2012.

Dalton Jerson Trevisan, curitibano nascido a 14 de junho de 1925, reconhecido pela crítica como um dos principais contistas da literatura brasileira. É famoso pela sua obra e por sua natureza reclusa – avesso a entrevistas e exposição na mídia.

O livro é composto por quinze contos caracterizados pela narrativa curta e riqueza de detalhes, por onde transita o personagem Nelsinho, um jovem curitibano de vinte anos de idade, caracterizado pelo bigode ‘a la Clark Gable’, obcecado por sexo, o que o leva a perseguir mulheres jovens, adultas e idosas, onde tudo, desde a roupa até um lábio molhado de saliva pela ponta língua é motivo de desejo, embora mantenha-se numa enclausurada solidão.

Livro que pela sua 32ª edição fala mais que qualquer comentário.


Luiz Humberto Carrião (l.carriao@bol.com.br) 

12 de janeiro de 2014

KAFKA E A MARCA DO CORVO: romance biográfico sobre a vida e o tempo de Franz Kafka / Jeanette Rozsas. – São Paulo: Geração Editorial, 2009.

Literatura e Psicanálise – existe relação entre elas? Uma coisa é certa, a literatura pré-existe à psicanálise. Depois, Gilcia Gil Becker assevera que ‘como fruto da subjetividade e forma sublimatória da pulsão, a literatura fornece preciosos elementos para análise das manifestações inconscientes’, reporta a Freud ‘que sempre reconheceu o quanto a arte e a literatura anteciparam e confirmaram as descobertas da clínica psicanalítica’. O grego Sófocles que o diga!

Jeanette Rozsas nos coloca como psicanalista numa cadeira ao lado de um divã onde Franz Kafka se dispõe a falar de sua infância interrompida, de sua adolescência roubada, das invalidações, de sua mente inquieta. Na adultez, os esforços frenéticos para evitar um abandono real ou imaginário; relacionamentos instáveis; perturbação de identidade com resistência a autoimagem; recorrência a pensamentos suicidas; instabilidade afetiva; sentimento crônico de vazio.

Não se trata de obra de ficção. Jeanette construiu os diálogos com esmero cuidado na seleção de cartas e diários do biografado e seus amigos mais próximos. Traz desde a sua introdução um extraordinário texto descritivo sobre a cidade de Praga do quarto quartel do século XIX. Texto que se prende aos detalhes valorizando as mínimas coisas. Uma paisagem que se confunde com o próprio Kafka. Praga e Kafka se fundiram em uma só entidade. A beleza de sua obra acabou por adornar uma joia esculpida pelos mais belos artistas do Império Austro-Húngaro, a cidade velha de Praga.

A autora começa a projetar a personalidade de Kafka a partir da realidade vivida pelo seu pai, Hermann Kafka, em sua convivência familiar na infância e adolescência; sua ida para a cidade de Praga onde conheceu Julie, que mais tarde lhe daria três filhos do sexo masculino: Franz, Georg e Heinrich, dos quais somente Franz Kafka sobreviveu. Na primeira vez que viu o filho Franz, Hermann o rejeitou por não se tratar da criança esperada. Ao invés de um brutamonte, forte, corado, guloso, que chorasse aos plenos pulmões dia e noite, característica dos ‘Kafka’, Franz era uma menino miúdo, magro, quieto, chorava quando com fome, de boa índole e com os cabelos pretos como os da família de sua mãe, os Löwy. Georg, o segundo filho, nasceu com todas as características desejadas por Hermann, que em momento algum se preocupou com sua preferência a Georg que, morreu de sarampo ainda na infância. Heinrich não era franzino como Franz e nem um brutamente como Georg, também morreu na infância com otite. Duas perdas para Franz, notadamente, Heinrich a quem era muito apegado. Seguiu-se a cobrança de Hermann sobre Julie na busca de outro filho, de outro Georg. Achava Franz um fracote. Muitas vezes chegava a falar para o menino ouvir que ele deveria ter nascido menina. E nesses momentos exarava a frase: _Ah! Se Georg não tivesse morrido... Invalidação total. Outras vezes quando da presença de visitas, chegava a afagar o filho, que de medo se encolhia. Nesse momento dizia aos convidados: _Vejam como o meu filho é medroso. Basta por a mão em sua cabeça que ele encolhe como um ratinho! E explodia em gargalhada deixando o pequeno Franz mortificado de vergonha. Outras vezes diante dos irmãos Hermann gritava para Julie ouvir: _Isso Julie, carregue o menino agarrado à sua saia e você terá um mariquinha para criar. Enquanto as risadas do pai explodiam como trovões, o pequeno Franz lutava contra as lágrimas. Isso não deixava de ser um abuso em referência à sexualidade do menino. Os reflexos vieram ao longo de sua efêmera existência.  Um livro necessário à estante de psicólogos, psiquiatras, psicanalistas. Em ‘Kafka e a marca do corvo’ o leitor não deixa de ser um analista num romance biográfico que revela toda a subjetividade humana.


Luiz Humberto Carrião (l.carriao@bol.com.br)